domingo, 16 de janeiro de 2011

Orgasmo feminino – porquê continuar a ignorar o problema?

Na relação heterossexual, os homens, através da penetração vaginal, têm prazer e atingem normalmente o orgasmo; ora, como os homens têm sido o sexo dominante, este modelo sexual foi também o modelo que se instituiu como norma e esta sexualidade androcêntrica foi naturalmente imposta às mulheres que a interiorizaram.
Durante praticamente toda a história da humanidade, este modelo sexual não levantou qualquer problema (1) porque a desatenção relativamente aos interesses das mulheres era simplesmente natural; (2) porque as questões relacionadas com o sexo eram tabu e não se lhes dedicava qualquer atenção minimamente séria e ainda (3) porque para a procriação o orgasmo feminino era dispensável.
Só a partir do século XIX, a recém-criada ciência da sexologia se começou a debruçar sobre as questões sexuais e a reconhecer que as mulheres também tinham direito ao prazer sexual. Mas os termos em que a relação sexual era entendida continuavam a ser os mesmos e muitas mulheres não atingiam o orgasmo porque para elas a penetração vaginal mostrava-se insuficiente.
Estava-se perante um problema, mas, ao invés de se reconhecer que provavelmente o modelo sexual seguido era masculino e não convinha às mulheres, os sexólogos, médicos e psicólogos decretaram que eram as mulheres que estavam erradas: as mulheres que se queixavam de não atingirem o orgasmo na relação sexual eram consideradas frígidas - doentes a requereram tratamento -, não era o modelo que estava errado, eram elas que estavam “erradas”.
O peso da tradição e do preconceito é tão grande que as coisas se mantiveram praticamente inalteradas e só nas últimas décadas as autoras feministas têm vindo a contestar este modelo sexual e a alertar para o autêntico problema de saúde pública que é a insatisfação sexual de um número muitíssimo significativo de mulheres; as estatísticas não são rigorosas, mas tudo leva a crer que os índices de mulheres que não atingem o orgasmo na relação sexual, via penetração vaginal, ultrapassa largamente os 50%. Se estes números reflectissem uma doença, estar-se-ia perante uma verdadeira endemia. Mas hoje, que já se fala mais sobre estes assuntos, embora ainda não o suficiente, sabe-se que o tempo necessário para mulheres e homens atingirem o orgasmo através da masturbação é praticamente equivalente e portanto, se as mulheres pela masturbação – estimulação do clítoris - atingem o orgasmo, então elas não são frígidas quando não o conseguem na relação sexual «normal», sem estimulação do clítoris, essa relação é que não se revela adequada.
O que não deixa de ser curioso é que as mulheres continuam colonizadas, mesmo as mais jovens e aparentemente mais desinibidas, e quando surgem oportunidades de debaterem este assunto fogem dele como o diabo da cruz, afinal até parece que a insatisfação sexual das mulheres, que as estatísticas situam em números absurdamente altos, é coisa que só acontece às outras. Por que será que as mulheres fogem da raia sobre um assunto que lhes diz directamente respeito?

3 comentários:

  1. (resposta:) falta de consciencializaçao da opressão masculina...

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  2. Bem, Boneca de Trapos
    Mas se de facto as mulheres ou pelo menos a maioria das mulheres não atingem o orgasmo atraves da simples penetração vaginal o assunto devia interessá-las, deviam debater, todavia o que vejo nos poucos blogs que se trevem a abordar estes temas é que praticamente não há comentários, mesmo quando outros posts dos mesmos blogs são amplamente comentados. Tem de haver outras razões e vou proximamente especular sobre o assunto.
    abraço, Rita

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  3. Oi Rita! Belíssimo post, concordo totalmente que é uma questão muito pouco debatida. Creio que muitas mulheres têm receio de confessar que não atinjem orgasmo com a penetração, pois se torna uma mentira tão enraizada que elas se sentem incompetentes por isso. Foram convencidas de que o problema é com elas, e temem decepcionar seus parceiros. Arrisco até dizer que algumas nem conhecem o orgasmo, e acabam por se contentar com algo parecido por falta de conhecimento do próprio corpo.

    Bjs

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